1.Humilde(s) de espírito.
O que significa ser humilde de espírito?
A palavra “humilde” também pode ser traduzida como “pobre”. Vem do grego ptwcos que significa “mendicante, dependente do auxílio alheio, pobre”[1]. O pobre no Antigo Testamento significava aquele que possuia necessidades materiais, mas não era apenas uma ausência de algo que ele gostaria de ter, mas de falência mesmo.
John Stott (p.28) diz que porque os “necessitados não tinham outro refúgio a não ser Deus, a “pobreza” recebeu nuances espirituais e passou a ser identificada como uma humilde dependência de Deus”.
O pobre de espírito ou o “contrito e abatido de espírito” é para quem o Senhor olha e para quem o Ungido fora enviado para pregar as boas novas (Is 57.15; 66.1,2 Lc 4.18; cf. Mt 11.5).
“Pobre de espírito” é o que reconhece sua falencia espiritual diante de Deus. Eles sabem e confessam que são pecadores e que estão debaixo da santa ira de Deus e que nada merecem além do juízo de Deus. Como disse Stott: o pobre de espírito nada tem a “oferecer, nada a reivindicar, nada com que comprar o favor dos céus”[2].
“Nada em minhas mãos eu trago,
Simplesmente à tua cruz me apego;
Nu, espero que me vistas;
Desamparado, aguardo a tua graça;
Mau, à tua fonte corro;
Lava-me, Salvador, ou morro”[3].
João Calvino disse que “só aquele que, em si mesmo, foi reduzido a nada, e repousa na misericórdia de Deus, é pobre de espírito”[4]. Nosso lugar deve ser do lado do publicano que bate no peito e não consegue levantar seus olhos aos céus e não ao lado do fariseu autosuficiente, pois somente aquele que reconhece sua limitação é que possui o reino dos céus.
Exemplos positivos e negativos na Bíblia
Exemplo(s) negativo(s): a Igreja de Laodiceia.
Temos um triste relato nas Escrituras de uma igreja, Igreja de Laodicéia, que recebeu o adjetivo de miserável pela boca do próprio Senhor Jesus. Ela dizia: “Estou rico e abastado, e não preciso de cousa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu” (Ap 3.17). Era autosatisfeita e superficial. Jesus estava fora da vida da igreja e não dentro. Era composta por cegos e mendigos nus que não admitiam a triste realidade que viviam. Eles eram aos próprios olhos ricos e não pobres de espírito.
Exemplo(s) positivo(s):
Existem, no entanto, muitos exemplos positivos de homens humildes de espírito nas páginas da Bíblia. Gideão foi um desses homens que quando recebeu a visita do anjo enviado por Deus para anunciar-lhe o grande feito que ele estava prestes a realizar, objetou: “não, não; isso é impossível. Pertenço à menor tribo de Israel e à menor família dessa tribo”. Esse homem realmente acreditava no que estava dizendo.
Moisés também tinha consciência de sua inadequação e insuficiência diante da obra que o Senhor queria fazer através dele.
Davi também demonstra o mesmo espírito quando disse: “Senhor, quem sou eu, para que venhas a mim?” Diante da presença de Deus homens humildes de espírito declaram como Davi e Isaías a sua falência espiritual, sua pequenez e pecaminosidade (Is 6).
No Novo Testamento temos tantos outros que se mostraram humildes de espírito, mas quero olhar apenas para o nosso maior modelo, Jesus. Embora sendo plenamente Deus, enquanto esteve nesse mundo, viveu também como sendo (pois era) plenamente homem. Como homem ele pode declarar: “Nada faço por mim mesmo” (Jo 8.28). Também disse: “As palavras que eu vos digo não as digo por mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, faz as suas obras” (Jo 14.10). Sem dúvida alguma a prova maior da humildade de Jesus estava estampada na sua vida constante de oração ao Pai. Em todas as páginas dos evangelhos vemos nosso Mestre orando. Orando para escolher os discípulos. Orando antes de enfrentar tentações e enquanto enfrentava. Orando de dia, de noite e nas madrugadas.
Qual a bênção que eles recebem?
“... dele é o reino dos céus”. O Reino de Deus e o Reino dos céus são sinonimos em Mateus e significa a área onde o poder de Deus se manifesta. Pode se referir aqui ao reino dos céus, vida eterna, ao reino messiânico, mas também pode significar o reino de Deus sobre a vida daquele que é humilde de espírito. Deus atua dando graça e capacidade àquele que reconhece que depende totalmente do auxílio divino.
Ainda hoje a única forma de um homem e uma mulher, um casal experimentar a manifestação do reino dos céus no seu casamento e na sua família é reconhecer a própria pobreza espiritual. Deus resiste aos soberbos, mas aos humildes, dependentes, Ele estende a Sua graça. C.H.Spurgeon disse que “para subirmos no reino é preciso rebaixarmo-nos em nós mesmos”.
Esse caráter do súdito do reino de Deus é completamente oposto aos valores da vida moderna. Lloyd Jones no seu comentário dessa expressão diz que os homens do mundo procuram expressar-se, acreditar em si mesmos, tomar conhecimento das suas capacidades inatas e deixa que o mundo inteiro as veja e reconheça[5]. Autoconfiança, segurança própria e autodependência são os valores do mundo.
Considerações sobre o termo “humilde de espírito” para a família cristã.
1. O termo “humilde de espírito” mostra claramente que o homem não é salvo pelas suas obras.
2. Não existe cristão que não seja humilde de espírito.
O que está em foco aqui é a atitude de uma pessoa para consigo mesma. Todo o verdadeiro cristão desfrutará do reino dos céus. Todo cristão têm a vida eterna como promessa do Senhor. Ele crê em Cristo para sua salvação em primeiro lugar porque percebeu sua necessidade de um Salvador devido à sua falência espiritual, por causa dos seus pecados. Quem não reconhece-se diante de Deus como um pecador e que o salário do pecado o conduz à morte, esse não vê necessidade de um Salvador e de alguém que o auxilie na sua caminhada, logo, esse é o primeiro passo que uma pessoa precisa tomar para ser um cristão.
· Você se ver como um pecador? Você já entendeu que o salário do pecado é a morte? Que não há um justo seque, não há quem busque a Deus e que todos se extraviaram e a uma se corromperam? Que todos pecaram e carecem da glória de Deus? A Palavra de Deus diz que se “disseremos que não cometemos pecado fazemos de Deus um mentiroso e a verdade não está em nós”. Você pode dizer que não tem pecado?
3. Um casal para glorificar a Deus precisa ser humilde de espírito
Se somente os que são sal da terra e luz do mundo é que influenciam positivamente o mundo por meio do seu caráter cristão, levando as pessoas a glorificarem ao Pai que está nos céus por meio das boas obras, logo, podemos afirmar que somente um casal de cristãos pode glorificar a Deus através de suas vidas.
4. Um casal humilde de espírito reconhece a fragilidade humana e não espera perfeição por parte do conjuge nem dos filhos.
É um erro entrar no casamento achando que está casando com o príncipe encantado das histórias de Wall Disney e que nunca enfrentarão problemas. Onde pecadores se encontram podemos esperar pecados. Nós erramos e erram conosco. No casamento não é diferente. Mais cedo ou mais tarde magoaremos a pessoa que tanto amamos. Não estou com isso querendo justificar todos os pecados e dizer que é assim mesmo. Não estou dizendo que todos os maridos irão adulterar e que as mulheres serão rixosas, mas o que estou querendo dizer é que a perfeição não existirá numa família formada por dois ou mais pecadores. Pegar uma rosa sabendo que ela tem espinho me ajuda a não furar a mão. Entrar num casamento sabendo que ambos são pecadores nos faz ajustar nossa expectativa e colocá-las dentro do plano da realidade.
5. Um casal humilde de espírito não procura rebaixar os padrões de Deus para se sentir melhor, mas entende que esses padrões os conduzem à graça de Deus.
Aqui está um grande perigo para todos nós! Diante das exigências da Lei, diante das palavras do Rei Jesus no seu sermão do monte nós podemos ter duas atitudes: rebaixarmos os padrões de Deus ou deixar que eles nos condenem e nos mostre a nossa pecaminosidade. Como dizem que a verdade dói e dói mesmo, a tendência da maioria das pessoas é considerar a mensagem de Cristo como utópica.
Os maridos olham para outra mulher com olhar impuro e dizem: “não tem problema, não estou pecando, estaria pecando se estivesse me deitando com ela. Não estou traindo minha esposa e, além do mais, todo mundo faz isso”. Outro homem pode olhar para a mesma mulher, desejá-la e dizer: “Sou um miserável pecador, impuro e adúltero! Deus me ajude, preciso muito do Senhor e do teu perdão, livra-me de desejos como esse e faz com que ame minha esposa cada vez mais”. Um homem confrontado como adúltero por olhar para uma mulher com olhar impuro, entende o padrão elevado do reino e sabe que não pode fazer nada a não ser recorrer a um Salvador perfeito.
Os pais erram muitas vezes na educação dos filhos por diminuirem o padrão de Deus. Justificam os pecados dos filhos dizendo: “são crianças”! Sim, são crianças e muitas coisas são compatíveis com a idade de criança, mas pecado é pecado numa criança como num adulto. Manter o padrão de Deus na criação dos filhos auxiliam os pais a levarem seus filhos à fé em Cristo.
6. Um casal humilde de espírito não é sábio aos seus próprios olhos.
· O marido procura na Palavra de Deus o que Deus espera dele e pede que o auxilie na tarefa;
· A esposa procura na Palavra de Deus o que Deus espera dela e pede que a auxilie na tarefa;
· Os pais procuram na Palavra de Deus o que Deus espera deles e pedem que os auxiliem na tarefa;
· Os filhos procuram na Palavra de Deus o que Deus espera deles e pedem que os auxiliem na tarefa;
[1] Nova Chave Linguística do Novo Testamento Grego, p.62,63.
[2] Stott, p.28.
[3] Stott, p.29.
[4] P.261
[5] Lloyd Jones, p.40.